“Há 10 anos era impensável fazer o que se faz hoje. A intenção é, daqui a 10 anos, se fazer coisas, impensáveis hoje”, disse à agência Lusa o vocalista do grupo de música africana, Gabi Fernandes, a propósito do lançamento do nono álbum de originais, na sexta-feira, em Lisboa.
O cantor assumiu algum do caminho desbravado para a música africana ter a projeção que tem hoje, sublinhando o facto de esta ser “uma banda lusófona”, apesar da kizomba – um género musical mais angolano – ser a sua essência.
“As nossas raízes sobrepõem-se, porque a nossa intenção é divulgar a música africana pelo mundo”, disse, referindo que estas décadas a percorrer Portugal e grande parte do mundo mostrou-lhes que não há palco como em África.
“África é sempre África. É onde nos sentimos em casa”, disse o cantor, de origem cabo-verdiana, que teve “o privilégio” de aprender com mestres como Paulino Vieira, Norberto Tavares, Raul Indipwo e vários outros “grandes nomes de música africana”.
Dos primeiros tempos a acompanhar o Duo Ouro Negro, o grupo ganhou “uma grande estaleca” e também consciência daquilo que as pessoas queriam ouvir.
“Há pouco tempo, a música africana tinha espaços e zonas específicos para tocar. Não tocava em tudo o que era rádio, discotecas, não estava nas lojas. Quando se queria ouvir música africana tinha-se de ir a sítios específicos e foi também com essa ideia que projetámos a banda Irmãos Verdades”.
“Já passámos por muitos sacrifícios, já tocámos em sítios em que, como banda, éramos mais do que o público”, recordou, classificando os altos e baixos de “uma escola”.
E prosseguiu: “Há uns anos, a cultura africana estava paralela à cultura portuguesa, lado a lado, sem se encontrar. Alguém tinha de fazer um desvio, sem destruir a outra”.
Gabi Fernandes assume-se como um “apologista da fusão”, mas desde que os tipos de música não se sobreponham, nem se confundam.
“Temos de ir na linhagem da música africana, porque daqui a bocado vamos ter grandes cantores africanos a cantar música que não é música africana, é uma música que tem tanta fusão que se vai confundir com as nossas raízes”, alertou.
A própria composição da banda “é uma fusão” na medida certa, uma vez que tem elementos e colaboradores de Angola, Cabo Verde, Guiné-Bissau, São Tomé e Príncipe, Portugal, uma verdadeira lusofonia, como gosta de sublinhar.
O novo disco de originais da banda, que será lançado na sexta-feira, durante um concerto no espaço Lisboa Ao Vivo, foi para o mercado há três dias e o vídeo do primeiro single “Te Amo” já conta com largos milhares de visualizações.
Mas este trabalho e os espetáculos que já estão a decorrer, assim como a digressão que começa na sexta-feira, marcam igualmente o regresso de os Irmãos Verdades aos palcos, após a pandemia.
Gabi Fernandes recordou que este foi o primeiro grupo de música africana a tocar, sozinho, no Coliseu dos Recreios de Lisboa.
“Estávamos com muitas saudades. Estivemos mais de dois anos sem fazer um único concerto”, lamentou.
O grupo aproveitou para fazer outro tipo de trabalho na área da música, mas reconhece que é no palco, junto do seu público, que se sente em casa.
“É muito gratificante. Estávamos mortinhos para subir ao palco. Os cantores e os artistas estão bem é no palco. No palco é que estamos em casa”, disse o vocalista, com 58 anos.