“Este projeto começa como um projeto pequeno, a partir do mito de Dafne, para a villa Borghese, em Roma, que nunca aconteceu. A equipa foi para casa no confinamento, a bordar folhas, porque era a única coisa que eu podia mandar para toda a gente. E eu pensei, o que é que vamos fazer? Vamos bordar as folhas da dita árvore e Jean-François Chougnet [comissário da exposição] achou que seria um bom projeto para a Capela. E então nasceu a ideia de transformar a árvore de Dafne em ‘Arvore da Vida’, associada a esta ideia de recomeço”, afirmou Joana Vasconcelos em entrevista à agência Lusa, em Paris.
Esta obra nasce assim da inspiração intemporal de um mito grego, em que Dafne, primeiro amor de Apolo, o rejeita e pede ao pai que a ajude a fugir à insistência deste deus, acabando por transformá-la num loureiro, e do contexto em que a peça foi concebida, a data original da Temporada Cruzada entre Portugal e França, que coincidiu com a pandemia de covid-19.
“Foi algo produzido em plena pandemia, a partir de reciclagem de materiais e tecidos que tinha no ateliê. Foi a ocupação de muita gente durante muitos meses e foi o foco das emoções – até o desespero e ansiedade – e a pergunta ‘o que será o futuro?’. Todas essas emoções fazem parte deste projeto. Disse à equipa e a mim própria, que tinha de fazer algo positivo e fantástico para comemorar a saída desse período”, explicou a artista.
Joana Vasconcelos criou uma “árvore luxuosa e sensual” em tons de vermelho, castanho e dourado, com um intrincado tronco de tecido, com várias técnicas artesanais com lãs e outros materiais, que se propaga depois na copa em dezenas de ramos que acolhem cerca de 140 mil folhas, algumas em bordado de Castelo Branco, outras cobertas de lantejoulas, e ainda folhas de couro, onde foram instaladas milhares de luzes LED.
A artista não consegue estimar o tempo passado pela sua equipa a executar este projeto, já que abrangeu os períodos de confinamento, em que os artesãos não podiam ir ao ateliê, com Joana Vasconcelos a qualificar esta obra como “de alta-costura”, devido à atenção que recebeu e a tudo ter sido “feito à mão”.
Esta obra devia ter sido inaugurada em setembro de 2022, de forma a encerrar a Temporada Cruzada entre França e Portugal, mas devido a problemas técnicos, a abertura foi adiada para abril deste ano.
Para erguer esta estrutura e instalá-la dentro da capela centenária, a artista portuguesa teve a seu lado os especialistas do Centro Nacional dos Monumentos de França.
“Tive uma ótima experiência, acho que França tem uma estrutura que mais nenhum país tem, com gente com muita experiência. São exigentes, o património é para ser bem cuidado, há dificuldades em trazer a arte contemporânea à História – é normal. Mas não tive problema nenhum, acho que nos ajudaram imenso”, revelou Joana Vasconcelos.
Para além da pandemia, esta instalação vem, segundo Joana Vasconcelos, responder também à problemática da guerra, especialmente o regresso da guerra ao continente europeu com a invasão da Ucrânia pela Rússia, devido ao seu caráter harmonioso, citando uma mulher importante para esta capela, Catarina de Médicis, viúva do rei Henrique II, que se dedicou à renovação do castelo de Vincennes após a morte do marido.
“Era uma mulher que acreditava que a valorização das artes trazia o bem ao Mundo e eu acredito nisso também”, afirmou Joana Vasconcelos. “É com estes objetos que valorizamos a mão-de-obra, a harmonia, a beleza e paz. A guerra é feia, é bélica, é industrial, é metálica e esta árvore é manual, detalhada e feita à mão”.
A visita à exposição vai ser acompanhada em permanência por uma música composta por Margarida Gil, especificamente para esta obra, que será interpretada por Rui de Luna. A peça musical partilha o nome da instalação: “Árvore da Vida”.
Para a inauguração oficial, que aconteceu na quinta-feira à tarde, esta música vai ser tocada ao vivo e o espetáculo vai contar com o ministro português dos Negócios Estrangeiros, João Cravinho, a ministra francesa dos Negócios Estrangeiros, Catherine Colonna, sendo também esperada a presença do ministro português da Cultura, Pedro Adão e Silva, e da sua homóloga francesa, Rima Abdul Malak, entre outras figuras de Portugal e de França.
Nos próximos meses, Joana Vasconcelos vai continuar a inaugurar obras em diferentes países, com o “O Bolo de Noiva”, a ser aberto ao público já em maio, no Reino Unido, com a sua “Valquíria” feita para o desfile da marca Dior a viajar em julho até à China.
Joana Vasconcelos terá também uma instalação nas Galerias Uffizi e no Palácio Pitti, em Florença. Em setembro, terá uma exposição no Museu de Arte, Arquitetura e Tecnologia (MAAT), em Lisboa.